O Estatuto das
Famílias, que tramita na Câmara dos Deputados (PL 2.285/2007, apensado ao PL
674/2007) e foi reapresentado no Senado em 12/11 (PL 470/2013), com o mesmo
conteúdo, embora com roupagem diferente, parte de premissas individualistas,
aparentemente baseadas no afeto, mas que pretendem impor em nossa legislação,
por meio de engodo linguístico, a devassidão. Essa legislação projeta que as
denominadas relações paralelas - expressão enganosa, porque suaviza seu
conteúdo de mancebia - sejam alçadas ao patamar de entidades familiares.
Assim, consta do
título das Entidades Familiares, artigo 14, caput, que "as pessoas integrantes
da entidade familiar têm o dever recíproco de assistência, amparo material e
moral, sendo obrigadas a concorrer, na proporção de suas condições financeiras
e econômicas, para a manutenção da família". E no parágrafo único do mesmo
artigo, que "a pessoa casada, ou que viva em união estável, e que
constitua relacionamento familiar paralelo com outra pessoa, é responsável
pelos mesmos deveres referidos neste artigo, e, se for o caso, por danos
materiais e morais". Os amantes terão direito a pensão alimentícia e
poderão, ainda, requerer reparação dos danos morais e materiais por falta das
mesmas atenções e benesses dadas às famílias oriundas de casamento ou união
estável. Isso é poligamia.
O Estatuto chega
ao cúmulo, nas suas justificativas, de argumentar que "a realidade social
subjacente obriga a todos, principalmente a quem se dedica ao seu estudo, a
pensar e repensar o ordenamento jurídico para que se aproxime dos anseios mais
importantes das pessoas". Desde quando é anseio social no Brasil que as
relações conjugais ou de união estável admitam relações paralelas ou mancebia?
Vê-se que o projeto distorce o pensamento social e quer institucionalizar a
poligamia.
Além da
poligamia velada, o projeto pretende institucionalizar a poligamia consentida.
Ora, quem recebe um trio formado por duas mulheres e um homem ou por dois
homens e uma mulher em sua casa e lhe diz: "Venha, sente-se e coma à minha
mesa"? Ditado que bem representa e resume que relações paralelas não são
aceitas pela sociedade e devem ser repudiadas pela legislação e por todas as
formas de expressão do Direito.
Ao proteger a
família, a Constituição estabelece no artigo 226, § 3.º, que as entidades
familiares são monogâmicas quando oriundas da união estável, que só comporta
duas pessoas, e não três ou mais. Portanto, o projeto é inconstitucional.
No artigo 69, §
2.º, do tal projeto, a "família pluriparental é a constituída pela
convivência entre irmãos, bem como as comunhões afetivas estáveis existentes
entre parentes colaterais". Estaria aí a busca de atribuição de legalidade
às relações incestuosas? Recorde-se que nesse projeto de lei tudo pode e cabe
numa entidade familiar, em afeto e sexualidade.
Nas famílias
chamadas recompostas, o padrasto e a madrasta têm direitos e deveres para com
os enteados, compartilhando a autoridade dos pais, conforme o artigo 70. O
padrasto ou a madrasta, além de poder exigir a convivência com o enteado,
passará a ter o dever de pagar-lhe pensão alimentícia, em complementação ao
sustento que já lhe dê o pai ou a mãe, como prevê o artigo 74, o que é retomado
no artigo 90, § 3.º: "O cônjuge ou companheiro de um dos pais pode
compartilhar a autoridade parental em relação aos enteados, sem prejuízo do
exercício da autoridade parental do outro". Isso é multiparentalidade.
Com a tal
multiparentalidade haverá incentivo ao ócio, porque, se um jovem tiver duas
fontes pagadoras de alimentos (pai e padrasto ou mãe e madrasta), por que se
esforçaria para trabalhar? É um incentivo ao ócio também porque o genitor de
uma criança ou adolescente, se pudesse exigir pensão alimentícia do ex-cônjuge
ou ex-companheiro, pela natureza humana, que cultiva, ainda que no íntimo de
seu ser, a preguiça, ficaria sem vontade de buscar recursos para auxiliar no
sustento do filho. Igualmente é incentivo ao desafeto, porque, em sã
consciência, será evitada a união com quem tenha filhos, em face da futura
obrigação de pagamento de pensão alimentícia diante da separação do genitor ou
genitora dos menores. Propaga-se o afeto e incentiva-se o desafeto. Trata-se de
óbvia contradição.
Pois esse
chamado Estatuto das Famílias, que hasteia uma simulada bandeira de afeto, visa
à deturpação familiar e ao consequente enfraquecimento da sociedade, que viverá
em completa imoralidade. Isso é devassidão na legislação projetada!
Nenhum comentário:
Postar um comentário